Havia algo no porão


Eu sempre acreditei em espíritos e fantasmas. Também achava que, se algum dia encontrasse um, eu não ficaria assustado. Eu estava certo sobre a primeira parte, mas completamente errado sobre a segunda. Esta história é um pouco longa, mas cada palavra é verdadeira.

Era o verão de 1996. Eu tinha acabado de terminar o colegial. O dia estava ensolarado, e alguns amigos e eu resolvemos dar umas voltas pelas estradas quase abandonadas que cercam a nossa pequena cidade. Não havia muito o que fazer por ali. Eu dirigia, e comigo estavam o Rafael e o Jair.

Sempre gostei de dirigir sem destino, perder o rumo de propósito. Eu costumava dizer: “Se você não sabe onde está e não se importa, então não está perdido.” Naquele dia, isso parecia fazer ainda mais sentido.

Depois de mais ou menos uma hora, estávamos bem longe da cidade, numa estrada de terra estreita, ladeada por campos que se estendiam até onde a vista alcançava. Alguns minutos depois, vimos uma casa de fazenda de dois andares, sozinha naquela imensidão, a uns cinquenta metros da estrada. O mato alto quase escondia a entrada. Parecia abandonada. Como não tínhamos nada melhor para fazer, decidi chegar mais perto.

À medida que nos aproximávamos, os detalhes ficavam mais nítidos. A varanda da frente estava quase intacta, mas a porta tinha tábuas pregadas, como se alguém quisesse impedir a entrada. Algumas janelas ainda estavam inteiras; as folhas de madeira, descascadas. O Jair comentou que parecia uma casa de filme de terror. Eu ri e disse que deveríamos entrar para dar uma olhada.

Sempre me considerei corajoso. Sou filho de um respeitado oficial do exército, hoje policial condecorado. Cresci ouvindo que tudo tem uma explicação lógica e que o medo é só falta de razão. Mas tudo isso estava prestes a ir por água abaixo.

Levamos uns dez minutos para reunir coragem e convencer a todos a entrar. Eram cerca de quatro da tarde, o sol ainda brilhava forte. Fomos pela porta dos fundos. Assim que encostei nela, abriu-se por completo, rangendo — como se a casa estivesse nos dando as boas-vindas.

No instante em que cruzamos a soleira, o ar pareceu mudar. Ficou pesado, denso, quase palpável. A porta se abria para um pequeno corredor. À direita, uma cozinha. À esquerda, outra porta — posicionada de modo que bloqueava o corredor quando aberta.

Passamos por ela. Atrás havia um porão. Era escuro, frio demais para um dia de verão. E havia algo de muito estranho: a escada que descia estava quebrada depois do terceiro degrau. O fundo era invisível, como um poço sem fim. Senti um arrepio, mas não dei importância. Fechei a porta com firmeza — lembre-se disso.

Seguimos pela cozinha, depois pela sala de jantar, até chegar à sala da frente. A casa, surpreendentemente, estava mobiliada: mesas, cadeiras, sofás, um velho piano coberto de pó. O Rafael disse que alguém ainda morava ali. Eu apontei para o chão — o pó era espesso, e só havia nossas pegadas. Isso me intrigou mais do que assustou.

Eles queriam ir embora, mas eu insisti que deveríamos ver o segundo andar. Foi aí que a coisa começou a mudar.

A escada ficava logo à frente da porta principal. Subimos e chegamos a um corredor estreito, com quatro portas — duas de cada lado. Três estavam fechadas. Abri a primeira à direita. Meus amigos seguiram para as outras.

O quarto era iluminado por duas janelas grandes. Não havia quase nada, apenas um velho gaveteiro e, ao lado dele, um buraco no chão — do tamanho de um pneu de carro. Através dele, dava para ver o primeiro andar. Eu me ajoelhei, curioso, e então aconteceu.

O ar ficou tão pesado que doeu respirar. Senti uma presença. Alguém — ou algo — estava lá comigo. E então ouvi o som.

Começou baixo, como um bocejo arrastado. Depois foi crescendo, se transformando em um gargarejo gutural, molhado, que parecia vir do pé da escada. O som subiu pelas paredes da casa, reverberando nelas, como se procurasse por nós. Foram só cinco segundos, mas pareceram uma eternidade. O pavor me paralisou. Meus pés gelaram. Quando o som cessou, o silêncio pareceu ainda mais vivo.

Levantei num impulso e saí correndo do quarto. Dei de cara com o Rafael e o Jair — o olhar deles dizia que tinham ouvido a mesma coisa.

Descemos as escadas num desespero cego. Quando chegamos ao andar de baixo, algo me fez parar. O chão.

As nossas pegadas tinham desaparecido. No lugar, marcas de algo arrastado, como se alguém — ou alguma coisa — tivesse passado por ali. O rastro começava (ou terminava) no pé da escada e seguia o mesmo caminho que havíamos feito, até a porta dos fundos. Só que não parava nela. Ele passava pela porta do porão.

A porta agora estava aberta.

Senti o sangue gelar. Aquele era o único caminho para sair. Estiquei o braço tremendo para fechá-la, mas o ar em volta parecia vivo — carregado de maldade. Juro que senti que algo ia sair dali e me puxar para dentro.

Fechei a porta de uma vez, choramingando como um animal acuado, e disparei para fora da casa.

Nem olhei para trás. Só pensava no carro — e no medo de que não pegasse, como nos filmes de terror. Mas ele pegou de primeira. Meus amigos pularam para dentro e saímos de lá o mais rápido que pudemos. E, naquele momento, eu realmente achei que estávamos fugindo pela vida.

Demorou um tempo até encontrarmos o caminho de volta à cidade. Quase não trocamos palavras.

Raramente falamos sobre aquilo até hoje. Contei essa história algumas vezes, mas ninguém nunca acreditou. Alguns tentaram me convencer a voltar lá, mostrar a casa.

Mas eu sei que não conseguiria encontrá-la de novo. E, sinceramente, espero que nunca consiga.